Se já no passado a invenção de notícias e entrevistas obrigavam os leitores em geral a ter algum cuidado e critério no crédito dado a este ou aquele órgão de comunicação social, a aposta cada vez mais intensa na inteligência artificial obriga a que o escrutínio por parte do público em geral seja ainda mais apertado, para que o crédito possa ser dado a quem de facto aposta na verdade colocada no seu trabalho editorial. Vem isto a propósito do mais recente desenvolvimento ocorrido em redor de uma entrevista que a revista alemã Die Aktuelle publicou supostamente concedida por... Michael Schumacher, o antigo piloto e campeão do Mundo de Fórmula 1. Anne Hoffmann, editora daquela publicação, acabou demitida depois de promover o que não passou de uma “entrevista fake”, algo assumido pelo próprio grupo de Comunicação germânico Funke, detentor daquela revista, depois de ter sido confirmado que as citações atribuídas a Schumacher foram geradas através de um programa de inteligência artificial.
Certo é que a edição da revista Die Aktuelle gerou polémica na Alemanha, o país natal de Michael Schumacher, ao avançar com uma entrevista que teria sido concedida por Schumacher, algo que, a acontecer, seria a primeira entrevista depois do acidente nos Alpes franceses naquele fatídico dia 29 de Dezembro de 2013. Depois do acidente, Michael Schumacher ficou 254 dias hospitalizado na Suíça e só então regressou a casa, onde alegamente se mantém até agora num ambiente mantido em segredo pela sua família que procurou preservar sempre a privacidade do piloto. Por via disso mesmo, e perante esta “entrevista” produzida por inteligência artificial, os familiares de Michael Schumacher prometeram agir legalmente para processar a entidade responsável pela publicação do texto e Bianca Pohlmann, directora do grupo de revistas Funke, apressou-se a vir a público pedir desculpas pelo episódio.
Refira-se que desde o acidente de 2013, apenas recentemente houve alguns comentários por parte de familiares de Schumacher sobre o seu estado, nomeadamente aquando da publicação em 2021 de um documentário sobre a vida e carreira do piloto alemão que estreou na Netflix e no qual a família abordou, de uma forma muito superficial, o estado de saúde do antigo piloto. Apesar disso, Corinna, a mulher de Schumacher, tem feito tudo para preservar a privacidade do marido e de toda a família e o próprio filho de Schumacher, Mick, actual piloto de testes da Mercedes-AMG Petronas, tendo falado sobre o seu pai no documentário, foi ainda assim reservado, limitando-se a dar conta da natural tristeza por não partilhar com o pai a sua caminhada no automobilismo.
"Desde o acidente, aqueles momentos em família que tanta gente desfruta com o pai, para mim deixaram de existir, ou pelo menos acontecem de forma diferente, e do meu ponto de vista isso é muito injusto. Penso que ele ia entender-me de uma forma diferente porque agora falaríamos uma linguagem semelhante. E teríamos tantas coisas para falar... É precisamente isto que fica na minha cabeça, porque se fosse possível seria espetacular. Daria tudo para que isso acontecesse", afirmou o jovem piloto de 23 anos no referido documentário produzido pela Netflix.